Space Needle
Chegamos a Seattle na primavera, eu e o Alex. A cidade tinha um ritmo só dela. As coisas pareciam muito diferentes e distantes de minha realidade. Tudo era novo, perfeito e lindo.
Passamos duas semanas procurando emprego e visitando a cidade. Visitamos o The Seattle Center Fountain, o Parque Nacional, o Mercado de Peixe.
Lembro que no Warren G. Magnuson Park, mais especificamente no National Oceanic and Atmospheric Administration, estava um dia lindíssimo. Lá existem umas esculturas chamadas “A SOUND GARDEN”. E era de onde a banda Soundgarden tinha tirado o nome que os batizariam por alguns anos. As esculturas têm uma forma estranha, são de metal, e onde bate o vento, elas fazem um som. Um barulho meio indiscritível.
Claro, eu tinha que visitar o Space Needle. O monumento de toda a ostentação decadente de uma cidade quase portuária, mas com cheirinho do mercado de peixe. Fiz a minha tão sonhada viagem de trem. Foi maravilhoso. As fotos saíram um pouco ruins, porque, enfim, o dia tava nublado.
Sentei no trem às dez da manhã. Era tudo diferente. Eu podia ver a garoa caindo no vidro, fazendo aquelas gotículas de água quase imperceptíveis. A cidade estava toda nublada e eu era só curiosidade. Nada mais fazia sentido a não ser aquele momento.
As cadeiras do trem eram azuis, aveludadas, e toda cheia de nove horas. Meu coração pulava insistentemente em meu peito. Era a primeira vez que me via sozinha e cheia de responsabilidades em minhas mãos.
A responsabilidade de tocar minha vida, de dar um rumo nela. De me preocupar com contas a pagar, com meu futuro. Sem ninguém pra pensar por mim, nem pra agir por mim, nem pra dizer o que eu deveria dizer.
Enquanto o trem se movia eu pensava se poderia dar conta de tudo. Se eu não voltaria à casa dos meus pais arrependida, perdida, machucada. Apertava os olhos numa tentativa de esquecer esses pensamentos. Eu mal sabia o que estaria por vir.
Cheguei ao Space Needle e enquanto o elevador subia, eu olhava a cidade ficar pequenininha lá de cima e pensava que tinha todas as oportunidades em minhas mãos, era só pensar e saber usá-las.
Aquilo era lindo, mesmo nublado. Tinha um ar diferente, um gosto diferente. Gastei parte de minhas economias para poder comer no restaurante lá em cima, mas tudo valia a pena. Até o Alex fazendo pose e quase caindo lá de cima para tirar uma foto.
Toda vez que olho pela janela e vejo o monumento, lembro daquele dia. Do friozinho na barriga, da boa melancolia. Da saudade de um tempo em que eu ainda era inocente. Um tempo em que eu acreditava que a vida era feita de ideais e não de fatos.
O episódio do Parque Nacional (um deles, porque têm tantos), foi o mais engraçado. Estava sol, e estávamos fazendo uma horinha sentados na grama. O Alex resolveu subir numa árvore super bonita que tinha perto da gente. Ficou todo empolgado pra eu tirar uma foto, pois então, subiu na árvore e fez cara de feliz.
Mas feliz fui eu que quase rolei no chão de tanto rir. Ele sentou no galho, e de repente começou a fazer várias caretas. E de caretas ele passou a berros e quase quebrou o galho de tanto pular. Nisso, ele vira e fala "tira logo essa foto, eu estou sendo comido por formigas!!!"
O mais engraçado foi que ele não saiu do galho, enquanto eu não tirei a foto. E pior, saiu nela, com cara de que ele estava feliz, por estar sentado em uma árvore tão inofensiva.
Visitamos as montanhas e andamos que nem uns condenados para ficarmos em uma cabana bem simples. Washington (estado onde fica Seattle, a sua capital), tem umas montanhas lindas. É frio, mas é gratificante. É um silêncio quase sepulcral. Uma paz que não presenciei mais, depois desse episódio. De um lado e do outro, você só vê montanhas e floresta. Enquanto caminha e o ar gelado bate no rosto. Nunca tinha visto nada igual.
Depois fomos conhecer o Píer e o Mercado de Peixe, que também são atrações da cidade.
Aqui existem ‘coffee houses’ em todos os lugares. Eles recebem grãos do Brasil e da Colômbia, mas o café não é como aí em baixo. É estranho e se consome uma quantidade de café absurdamente maior que um simples cafezinho. Parece que se toma mais café do que água.
E o frio? É muito frio. Frio a maior parte do tempo. Para quem estava acostumado com dias ensolarados e muito calor, se acostumar com esse tempo foi um tormento. Em casa tudo quentinho (quero dizer, depois que mudamos de downtown) e fora, um frio dolorido. Dá vontade de dormir o dia todo.
Mas eu falava das atrações turísticas. Das atrações diurnas, passamos às atrações noturnas. Visitamos cada buraco que nosso dinheiro suportava. A vida noturna é bem agitada. Lugares que comportam todos os tipos de pessoas. Alguns muito bons outros muito ruins. O único inconveniente aqui é que os bares fecham muito cedo. Mas tudo vale a pena.
Nesse ponto estávamos eu e o Alex, procurando emprego e nos hospedando em um hotelzinho não lá muito bom, downtown.
Eu digo downtown, porque aqui quer dizer centro da cidade. Tudo fora de downtown é periferia. E por incrível que pareça morar na periferia é melhor. Mas como não tínhamos dinheiro, estávamos em downtown. Pelo menos o chuveiro era quente e o quarto era limpo.
Mesmo com todas as nossas saídas, continuávamos a procurar um emprego. Até que achamos uma lanchonete perto do hotel em que nos contratou para trabalharmos lavando pratos e servindo comida. Se ganha mais dinheiro fazendo isso, do que trabalhando muito aí em baixo. Mas o custo de vida aqui é muito alto. Tudo é muito caro.
Nesse meio tempo em que começamos a nos estabilizar, eis que recebo uma bela “surpresa”. Num belo dia chuvoso de Seattle, me aparece Daniel.
O Conclave
Há 13 anos
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